O MITO DE “SÓ A LIBERDADE” DE LAMENNAIS A SANGNIER

Resultado de imagem para marcel lefebvreEles não temem traçar paralelos blasfemos entre o Evangelho e a Revolução”. São Pio X.

Apenas constituído, o liberalismo católico lança-se ao assalto da Igreja com a bandeira do progresso. Lembremos alguns nomes deste liberalismo progressista:

I

LAMENNAIS (1782-1854)

Felicite de Lamennais, sacerdote que se rebelará contra a Igreja e será infiel a seu sacerdócio, funda seu liberalismo sob o mito do progresso da humanidade que se manifesta pela aspiração crescente dos povos pela liberdade. Ele diz: este movimento “tem seu princípio indestrutível na lei primeira e fundamental pela qual a humanidade tem que se despojar progressivamente dos laços da infância, à medida que o cristianismo em desenvolvimento vá emancipando a inteligência e os povos alcancem a idade madura”127. Na Idade Média a humanidade está na sua infância e necessita da tutela da Igreja: hoje os povos já adultos, devem se emancipar desta tutela separando a Igreja do Estado. Quanto à Igreja, ela deve se adaptar a  esta  nova  ordem de  coisas que  Ela  mesma  criou: “uma nova ordem social, fundada no grande desenvolvimento da  liberdade, que o catolicismo fez necessário, aumentando em nossas almas a verdadeira noção e o sentimento do direito”. Na apresentação do programa do jornal “l’Avenir” vemos o arremate perfeitamente liberal da teoria de Lamennais:

“Todos os amigos da Religião precisam compreender que ela necessita somente de uma coisa: da liberdade”.

Era querer submeter a Igreja ao direito comum a todas as  associações e confissões religiosas diante da lei. Gregório XVI não podia deixar de condenar tal erro e o fez na Encíclica “Mirari Vos” de 15 de agosto de 1832,condenando…

“Aqueles que querem separar a Igreja do Estado e romper a mútua concórdia entre o Império e o Sacerdócio: pois o que é certo é que esta concórdia que sempre foi tão saudável e favorável aos interesses da Religião e da autoridade civil, é temida pelos partidários de uma liberdade desenfreada”128.

E igualmente:

“Este princípio absurdo, ou melhor dito, este delírio, que defende a necessidade de assegurar e garantir a qualquer um a liberdade de consciência”129.

Certamente a Igreja não podia se acomodar ao princípio revolucionário  liberal  de  liberdade  para  todos,  que  a  todas as opiniões religiosas se reconheça a mesma liberdade sem discriminação. Quanto à emancipação progressiva da humanidade, a Fé Católica lhe dá seu verdadeiro nome: a apostasia das nações.

II

MARC SANGNIER E “LE SILLON”

Apesar das condenações dos Papas, o liberalismo progressista continua sua penetração na Igreja. O Padre Emmanuel Barbier escreveu um pequeno livro chamado “Le Progrés du Libéralisme Catholique em France sous le Pontificat du Pape Leon XIII”130. Nele há um capítulo que trata do “catolicismo progressista”, em que o autor diz: “A expressão catolicismo progressista é a que M. Fogazzaro apresenta em seu romance “Il Santo” para designar o conjunto de reformas que ele pede à Igreja em sua doutrina, sua vida interior e sua disciplina. Existe uma quase identidade de tendências entre os movimentos que estudamos na França, e aquele cujo porta- voz mais ouvido na Itália é, atualmente, Fogazzaro”.

Se Fogazzaro expôs sem constrangimento algum o plano de penetração do modernismo na Igreja, quer dizer que o modernismo e o catolicismo liberal são compartimentos vizinhos e têm táticas semelhantes131.

Em 1894 Marc Sangnier funda sua revista “Le Sillon” que se converte em um movimento da juventude que sonha em reconciliar a Igreja com os princípios da Revolução de 1789, o socialismo e a democracia universal, baseando-se no progresso da consciência humana. A penetração de suas idéias nos seminários e a evolução cada dia mais indiferentista do movimento, levaram São Pio X a escrever a carta “Notre Charge Apostolique” de 25 de agosto de 1910, que condena a utopia da reforma da sociedade, reforma esta acariciada pelos chefes do Sillon:

“Seu sonho é trocar os fundamentos naturais e tradicionais e prometer uma cidade futura edificada sobre outros princípios que ousam declarar mais fecundos, mais benéficos do que aqueles sobre os quais se apóia a cidade católica atual (…).

O Sillon tem a nobre preocupação da dignidade humana. Mas entende esta dignidade ao modo de certos filósofos que  a Igreja está longe de elogiar. O primeiro elemento desta dignidade é a liberdade, entendida no sentido em que, salvo  em matéria religiosa, cada homem é autônomo. Deste  princípio fundamental, tira as seguintes conclusões: Hoje o povo está sob a tutela de uma autoridade diferente dele, da  qual deve-se livrar: emancipação política (…). Uma organização política e social fundada sobre este duplo fundamento: a liberdade e a igualdade aos quais logo logo se juntará a fraternidade, isto é o que chamam Democracia”.

A exemplo de Leão XIII, após haver denunciado o falso slogan de liberdade-igualdade, São Pio X deixa patente as falsas fontes do liberalismo progressista do Sillon:

“Por último, com base em todas as falsificações das noções sociais fundamentais, o Sillon dá uma falsa idéia da dignidade humana. Segundo ele, o homem não será verdadeiramente homem, digno deste nome, senão no dia em que tenha adquirido uma consciência esclarecida, forte, independente, autônoma, sem necessidade de mestres, que obedeça somente  a si, capaz de assumir e levar avante as maiores responsabilidades. Estas são as palavras com que se exalta o sentimento do orgulho humano(…).

Mas como! Inspiram em vossa juventude católica a desconfiança de sua Mãe, a Igreja; ensinam que em dezenove séculos ela não conseguiu constituir no mundo a sociedade sobre suas bases verdadeiras; que Ela não compreendeu as noções sociais da autoridade e da liberdade, da igualdade, da fraternidade e da dignidade humana.

O sopro da Revolução passou por lá (…). Nós não temos que demonstrar que o advento da democracia universal não afasta a ação da Igreja no mundo (…).

São Pio X denuncia então o indiferentismo do Sillon, irmão daquele de Vaticano II132:

“Que devemos pensar de todos estes erros e do estranho convite feito a todos os dissidentes católicos para fortalecer suas convicções pelo estudo, e tirar delas fontes sempre mais

abundantes e novas forças? Que devemos pensar de uma associação de todas as religiões em que até o livre- pensamento133pode se manifestar em alta voz e a seu gosto?”.

E o Santo Padre vai ao fundo da questão:

“De agora em diante, o Sillon não passa de um miserável afluente do grande movimento de apostasia organizado em todos os países, para estabelecimento de uma Igreja universal que não terá dogmas, nem hierarquia, nem regra para o  espírito, nem freio para as paixões (…). Conhecemos bem as escuras oficinas em que são elaboradas estas doutrinas deletérias (…). Os chefes do Sillon não conseguiram se defender delas; a exaltação de seus sentimentos (…) os levou para um novo evangelho (…) sendo seu ideal semelhante ao da Revolução, não temem proferir blasfemas aproximações entre o Evangelho e a Revolução(…).

Finalmente o Santo Pontífice conclui, restabelecendo a verdade  sobre a verdadeira ordem social:

“(…)A Igreja, que jamais traiu o bem dos povos com elogios comprometedores, não deve esquecer o passado (…) basta retomar com o concurso dos verdadeiros trabalhadores a restauração social dos organismos atingidos pela Revolução134 e adaptá-los, com o mesmo espírito cristão que os inspirou, ao novo   cenário  criado  pela   evolução  material da sociedadecontemporânea135, pois os verdadeiros amigos do povo não são os revolucionários nem os inovadores, mas os  tradicionalistas”.

Eis os termos enérgicos e precisos com que o Papa São Pio X condena o liberalismo progressista e define a atitude realmente católica. Meu maior consolo é poder dizer que sou fiel à doutrina deste Papa canonizado. Os trechos que lhes citei esclarecem notavelmente as doutrinas conciliares sobre este assunto, nas quais me deterei na continuação deste trabalho.

Do Liberalismo à Apostasia – Mons. Marcel Lefebvre

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127ObrasCompletasT.X,págs.317-318,citadopeloDTC,T-VIII,col.2489

128 Cf. dez. nº 1615.

129 PIN. 24, cf. dez. nº 1613

130 Esta obra conserva todo seu valor, apesar da condenação prudencial que  recebeu naépoca.

131 Ploncard d’Assac, “L’Eglise Occupée”, cap. XV: Une Société Secréte dans L’Eglise?

132 Cf. “Dignitatis Humanae”, nº4.

133 O livre-pensamento é uma ramificação da maçonaria.

134 São Pio X designa aqui as corporações profissionais, agentes da concórdia social, totalmente opostos ao sindicalismo, que é o agente da luta de classes.

135 A evolução compreende um progresso material e técnico, mas o homem e a sociedade permanecem submetidos às mesmas leis. Vaticano II, em “Gaudium et Spes” desprezará esta diferença, inclinando-se novamente para o programa do “Sillon”.