SEGUNDA VELA: O DOM DE PIEDADE (AS SETE VELAS DE MEU BARCO)

piedadeHá muitos e muitos anos, no Norte da África, em Tipasa, onde hoje é o território da Argélia, vivia um povo que não conhecia Nosso Senhor.

Adorava como deus um dragão representado por uma estátua horrível e riquíssima, feita de ouro e prata, com dois diamantes no lugar dos olhos. Para esse dragão, o povo tinha construído um templo magnífico no alto de um rochedo, à beira-mar.

Todo o ano, no mês de maio, os moradores de Tipasa faziam uma grande festa em honra de seu deus, com procissões, danças, divertimentos, nos quais todos comiam muito, e bebiam ainda mais!

A pequena Salsa tinha horror a essas festas, pois era cristã! Vendo aquela gente adorar um ídolo ridículo, em vez de adorar a Deus, que é nosso Pai, sentia imensa tristeza.

Salsa não era muito crescida, tinha apenas quatorze anos, mas amava tanto a Deus que não podia deixar de procurar fazer alguma coisa por Nosso Senhor.

Assim, numa noite de festa do deus-dragão, ela encaminhou-se às escondidas para o templo no alto da rocha.

Todos os guardas tinham bebido muito e dormiam um profundo sono, deitados do lado de fora. Que sorte, para Salsa! Rapidamente, entra no templo e faz a volta do ídolo, procurando ver se está preso no pedestal. Observa então que a estátua é feita de duas partes: a cabeça é aparafusada sobre o corpo. Isso facilitará muito o seu trabalho! Devagar, para não fazer barulho, a corajosa menina faz girar a cabeça até que fique solta. Justamente, ali pertinho, há uma grande janela aberta sobre o mar, e, com um forte empurrão, a horrível cabeça é lançada às ondas. Ninguém percebeu nada!

Mas Salsa ainda não está satisfeita! É preciso também destruir o corpo. Este, porém, é por demais pesado para suas forças… a menos que ela arranje uma barra de ferro para servir de alavanca.

A noite está agora completamente escura. Lá fora, Salsa consegue achar um sólido ferro, e volta depressa para o templo. Enfia uma ponta sob a monstruosa estátua e, com um vigoroso impulso, joga aquele ídolo horroroso pela janela. Mas, desta vez, antes de cair no mar, a estátua bate nas pedras com terrível estrondo. Acordados pelo barulho, os guardas entram correndo no templo e cercam a menina, que não pode escapar. Com certeza vão matá-la. Não faz mal! O ídolo já não existe então, Salsa não se incomoda de morrer!

Por vingança, os guardas atiraram também a valorosa menina do alto do rochedo. Mas, três dias depois, seu corpo foi milagrosamente encontrado, perfeito, sob um navio que chegava da Gália.

– Hoje, a Santa Igreja chama essa menina SANTA SALSA.

Foi o dom de Piedade que levou Salsa ao heroísmo do martírio.

O dom de Piedade é que a fez compreender que só podemos adorar a Deus, porque só ele é infinitamente perfeito, porque só ele criou do nada o Céu e a terra.

O dom de Piedade pode ainda hoje levar ao martírio, e isso acontece por vezes. Mas o martírio não é obrigatório. Deus não pede isso a toda gente.

O que Deus pede a todos nós é que saibamos bem que ele é o nosso Pai, e que vivamos como seus filhos.

Viver como filhos de Deus não é sempre tão fácil quanto parece. Pois Jesus nos recomendou: “Sede perfeitos, como vosso Pai celeste é perfeito”. Para isso, precisamos que o Espírito Santo venha a todo instante ajudar-nos, lembrando-nos que somos filhos de Deus, irmãos de Jesus e irmãos de todos os homens. Já São Paulo explicava aos primeiros cristãos, numa das belas cartas que costumava escrever- lhes:

“O Senhor enviou à nossa alma o Espírito Santo, que nos faz exclamar do fundo do coração: Pai, Papai!” Até para rezar bem o “Pai Nosso”, temos necessidade do Espírito Santo. Sozinhos, podemos certamente “recitar” as palavras das orações, mas não compreendemos o que dizemos. E, sobretudo, não temos consciência de que aquele a quem falamos está presente no íntimo de nossa alma, e vivo no tabernáculo. É por isso que tantas vezes rezamos tão mal as nossas orações! E felizmente ainda quando não as esquecemos!

O Espírito Santo é que nos faz compreender que rezar é uma alegria, pois é falar com alguém a quem amamos.

As Sete Velas de meu Barco – M.D. Poinsenet