SERMÃO DA MISSA DA SAGRADA FAMILIA, PELO PE. JEAN-FRANÇOIS MOUROUX

Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo.

Caros fiéis,

Contemplando a vida da Sagrada Família, especialmente na época da Natividade do Menino Jesus, ficamos impressionados com as provações que essa família sofreu: uma viagem enquanto a Santíssima Virgem estava grávida, um nascimento na miséria, uma ameaça de morte e o exílio no exterior. Apesar de tudo isso, em nenhum momento imaginamos qualquer perda de tempo dentro desta família, mas um recolhimento contínuo que transformava todas as dificuldades em oportunidades de méritos. No início deste ano, devemos ter esta preocupação com o equilíbrio de nossa vida para não nos desviarmos do caminho da santificação. Este equilíbrio da vida implica a saúde do corpo, a da inteligência e a da alma.

Nesse desafio, os padres estão na linha de frente. O diabo sabe que se fizer um padre cair impedirá muitas graças, especialmente por causa de todos os sacramentos que serão impedidos de serem administrados. Ele os ataca particularmente.

I

O primeiro elemento necessário para uma vida equilibrada é um corpo saudável. Quando uma alma geralmente procura fazer o bem, o demônio sabe que propor o mal diretamente a ela tem poucas chances de sucesso. Ele vai, portanto, tentar sob a aparência de bem. No caso dos padres, seria querer realizar um apostolado desenvolvido de forma imprudente. Mais cedo ou mais tarde, o padre estará exausto. Esta é uma razão frequente para a ruína da saúde dos padres. Quando se está cansado; ou se dorme demais, levanta-se tarde e não se cumpre todos os deveres; ou se desperta cedo, mas não se cumpre bem o dever de estado. A pessoa cansada perde a concentração e fica irritável. Se tal situação persistir, é prenúncio de desastre.

São Francisco de Sales costumava dizer: “O dia começa com a hora de dormir”. “Para muitos, isto significa desligar os eletrônicos. Quanto tempo e sono se perde em frente ao nosso computador ou laptop – no dia seguinte, vemos as consequências, e nosso vizinho também.

Portanto, lembremos do ditado: “Mente sã em corpo são”.

O próprio São Paulo declara que não é bom pregar o Evangelho aos famintos. Acima de tudo, eles devem estar seguros do alimento do corpo, para que seu espírito possa estar preparado para receber o da alma.

A alimentação dos padres nunca é um problema – especialmente no Brasil. Os fiéis são muito atenciosos. Por outro lado, o esgotamento devido ao apostolado é um perigo real. Não sei se há muitas congregações em que os padres viajam tanto como na Fraternidade São Pio X, onde os padres passam tanto tempo no confessionário.

O Brasil é enorme – além do mais, seu povo é piedoso. E a crise da Igreja junto com a crise sanitária nos traz cada vez mais fiéis e pedidos de abertura de capelas. É uma grande alegria – mas é perigoso caso queiramos responder a todos imediatamente. Os esforços devem ser proporcionais às forças disponíveis, e as forças que já existem devem ser conservadas.

É necessário entender que os priorados foram desejados pelo Arcebispo Lefebvre para permitirem o descanso entre as missões. O jovem que liga às 11 da noite para dizer que tem vocação não entendeu isso. A pessoa que telefona no domingo à tarde para saber os horários de outro priorado também não.

II

O segundo elemento importante em nosso equilíbrio de vida: a saúde intelectual, a saúde da mente. Ela também precisa ser alimentada. Para fazer boas ações, precisamos ter bons pensamentos. Para ter bons pensamentos, devemos ter boas idéias. Para ter boas idéias, é preciso buscá-las onde estão: em bons livros; com bons mestres. A leitura e o estudo alimentam nossas crenças. Cada um deve fazê-los de acordo com sua capacidade. Viver sem vida intelectual é correr o risco de perder a fé.

Talvez tenhamos conhecido pessoas muito piedosas, muito devotas, muito dóceis – que desistiram de tudo. Por quê? Porque faltava substância. A árvore era linda por fora, mas esvaziou-se ao longo dos anos. Vieram as tempestades e ela não resistiu.

É altamente desejável ter sólidos hábitos cristãos. Mas isso não é suficiente. Quando uma provação perdura, devemos ter raízes em nossas convicções. Se não sabemos mais por que sofremos, se esquecemos o sentido da vida, não perseveramos. Depois de um tempo desiste-se, abandona-se tudo.

É muito importante conhecer o catecismo, fazer boas leituras: a vida dos santos, os escritos espirituais…. Tudo isso nos coloca em contato com bons exemplos, bons conselhos; conhecemos melhor nossa religião, nossa vida cristã.

A vida intelectual é importante especialmente para o padre. As pessoas esperam dele convicções, conselhos, explicações…. Se não estudar, sua pregação se tornará rapidamente repetitiva e oca. Sua palavra será pobre. E para piorar a situação, ele talvez esqueça o sentido de seu sacerdócio. Grande perigo: quando nossa cabeça está vazia, o diabo pode mais facilmente despertar maus pensamentos, dúvidas, problemas…

O priorado é também, portanto, aquele lugar de calma onde o sacerdote pode estudar para alimentar seu espírito, preparar suas conferências e sermões. Nos priorados da Fraternidade, após o café da manhã, que é por volta das 8 horas da manhã, os sacerdotes devem fazer meia hora de leitura espiritual, meia hora de leitura da Bíblia e finalmente uma hora de estudo. Isto é muitas vezes impossível porque os padres estão cansados e dormindo ou porque já estão ocupados com preocupações apostólicas. Isto é muito mau. É por isso que não se liga, sem urgência, antes das 9:30 (nove e meia) da manhã nos priorados.

Os senhores também, caros fiéis, devem buscar tempo para ler todos os dias – ainda que por cinco minutos. Considerando o tempo perdido na Internet, é possível.

III

O terceiro elemento necessário para o equilíbrio de nossa existência é a vida da alma. Isto pressupõe os sacramentos e a oração. A recepção dos sacramentos é nítida em nossa vida –sabemos quando os recebemos ou não. Por outro lado, há muito mais confusão do lado da oração – confusão grave, porque a oração é a respiração de nossa alma. Somos feitos para Deus e muitas vezes a única hora do dia em que pensamos em Deus é durante a oração, de manhã ou à noite. Assim, quando as orações não são feitas, simplesmente esquecemos de Deus. Esquecemos porque estamos na terra… Que tolice!

E mais uma vez, a oração nos dispõe para a recepção adequada dos sacramentos.

Todos nós recebemos a mesma absolvição, todos a mesma hóstia – qual é a diferença entre dois cristãos? Por que alguns são mais santos que outros? A resposta está nas disposições. As disposições boas, más ou medíocres nos tornam cristãos bons, maus ou medíocres – aproveitamos os mesmos sacramentos de maneira diferente. A vida de oração é, de fato, a base da vida cristã.

A pessoa que não reza não cresce espiritualmente. Ele logo ficará enfadado dos bens espirituais e cairá na tibieza. É então que o diabo vem para propor prazeres sensíveis, fáceis.

E quanto ao padre que não reza? Pouco a pouco, ele se transforma em um distribuidor de sacramentos. Ele, que deve santificar-se santificando os outros, irá tornar-se mero instrumento, puramente material. Ele não aproveitará aquilo que oferece a outros – isso é trágico. Aquele que está em contato diário com o sagrado, em contato com as mais sublimes realidades, chegará ao ponto de perder a estima por esses bens. Ele também pode cair na tibieza e em pecados mais graves.

Quando os padres estão em missão, passam horas confessando, celebrando a missa, abençoando, pregando, atendendo os fiéis. E muitas vezes eles sequer têm tempo para rezar; não digo o terço e outras devoções, mas até mesmo o breviário. Cuidado!

É por isso que o priorado é também aquele lugar de recolhimento onde os padres rezam em comum, e pessoalmente. Há quatro momentos de oração em comum: às 6h30min, o Ofício de Prima; às 12h15min, o Ofício de Sexta; às 18h30min, o Terço; e às 21h00min, o Ofício de Completas, logo após o jantar. É necessário, portanto, evitar perturbar os padres nestes momentos.

Saúde do corpo, saúde da mente e saúde da alma, eis o que garante o equilíbrio de nossa vida. Sem esses elementos, há um desastre em formação. É assim que, infelizmente, muitos na Fraternidade São Pio X já se perderam. É papel de cada superior assegurar que esse equilíbrio de vida seja mantido – e conto com todos os fiéis para me ajudar nessa tarefa. Queremos sacerdotes, muitos sacerdotes santos – e com saúde mental e física!

Os senhores também, queridos fiéis, busquem manter esse equilíbrio em suas vidas. Estamos no início do ano, um momento de resoluções. Examinem suas vidas. Vejam o que precisa ser mudado e façam uma resolução concreta e simples para preservar esse equilíbrio vital.

Peçamos ao Menino Jesus, à Santíssima Virgem Maria e a São José que nos ajudem nessa tarefa.

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo.

Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Pe. Jean-François Mouroux, Prior do Priorado de São Paulo

São Paulo, 10 de janeiro de 2021