Reginald Garrigou-Lagrange, O. P.
Em outro momento, disséramos porque devíamos nos confiar e abandonar à Providência: por causa de sua sabedoria e bondade, temos de sempre nos dirigir a ela, de corpo e alma, sob a condição do cumprimento do deveres cotidianos e da lembrança de que, se permanecermos fiéis nas pequenas coisas, obteremos a graça para o sermos nas grandes.
Vejamos agora como devemos nos confiar e abandonar à Providência, segundo a natureza dos acontecimentos que dependem ou não da vontade humana, do espírito desse abandono e das virtudes em que se deve inspirar.
DOS DIFERENTES MODOS DE SE ABANDONAR À PROVIDÊNCIA SEGUNDO A NATUREZA DOS ACONTECIMENTOS(1)
Para entender esta doutrina da santa indiferença, convém notar, como amiúde o fazem os autores espirituais2, que o abandono não se deve exercer do mesmo modo em face dos acontecimentos que não dependem da vontade humana, das injustiças dos homens e das faltas e suas conseqüências.
Caso sejam fatos que não dependam da vontade humana, como acidentes de impossível previsão, doenças incuráveis, o abandono nunca seria demais. Seria inútil a resistência, e só serviria para nos infelicitar; por sua vez, a aceitação em espírito de fé, confiança e amor conferirá grandes méritos a esses sofrimentos inevitáveis3
Em circunstâncias dolorosas, cada vez que se diga fiat, haverá novos méritos; a verdadeira provação tornar-se-á santificante. Mais ainda, no abandono lucraremos as provações possíveis, que talvez não se abatam sobre nós, como lucrou Abraão ao se preparar com perfeito abandono para a imolação do filho, a qual o Senhor depois não mais exigiu. A prática do abandono modifica as provações atuais ou futuras em meios de santificação, e tanto mais quanto for tal prática inspirada por um imenso amor a Deus. Continuar lendo