VAIDADE DO MUNDO – PONTO II

Imagem relacionadaÉ mister pesar os bens na balança de Deus e não na do mundo, que é falsa e enganadora (Os 12,71). Os bens do mundo são desprezíveis, não satisfazem e acabam depressa.

“Meus dias passaram mais depressa que um correio; passaram como um navio…” (Jo 9,25-26).

Passam e fogem velozes os breves dias desta vida; e que resta por fim dos prazeres terrenos? Passaram como navios. O navio não deixa vestígio de sua passagem (Sb 5,10). Perguntemos a todos esses ricos, sábios, príncipes, imperadores, que estão na eternidade, o que acham ali de suas passadas grandezas, pompas e delícias deste mundo. Todos responderão: Nada, nada. Ó homens, exclama Santo Agostinho, vós considerais somente os bens que possui aquele magnata; atentai também nas coisas que leva consigo ao sepulcro: um cadáver pestilento e uma mortalha que com ele se consumirá. Quando morre algum dos grandes, apenas se fala dele algum tempo; depois até sua memória se perde (Sl 9,7). E se caem no inferno, que farão e que dirão ali?… Chorarão, dizendo: Para que nos serviram o luxo e a riqueza? Tudo agora se passou como sombra (Sb 5,8-9) e nada nos resta senão penas, pranto e desespero sem fim.

“Os filhos do século são mais prudentes em seus negócios que os filhos da luz” (Lc 18,8).

Causa pasmo ver quão prudentes são os mundanos no que diz respeito às coisas da terra. Que passos não dão para adquirir honras ou fortuna! Quantos cuidados para conservar a saúde do corpo!… Escolhem e empregam os meios mais adequados, os médicos mais afamados, os melhores remédios, o clima mais saudável… e, entretanto, quão descuidados são para a alma!… E, no entanto, é certo que a saúde, as honrarias e as riquezas devem acabar-se um dia, ao passo que a alma, imortal, não tem fim.

“Observemos — disse Santo Agostinho — quanto sofre o homem pelas coisas que ama desordenadamente”.

Quanto não sofrem os vingativos, ladrões e licenciosos para atingir seus malvados desígnios? E para o bem da alma nada querem sofrer. Ó Deus! À luz do círio que na hora da morte se acende, naquele momento de grandes verdades, os mundanos reconhecem e confessam sua grande loucura. Então desejariam ter renunciado ao mundo e levado vida santa.

O Pontífice Leão XI disse na hora da morte:

“Em vez de ser Papa, melhor fora para mim ter sido porteiro no meu convento”.

Honório III, também Pontífice, exclamou ao morrer:

“Melhor teria feito, se ficasse na cozinha de minha comunidade para lavar a louça”.

Filipe II, rei de Espanha, chamou seu filho na hora da morte, e, depois de afastar a roupa, lhe mostrou o peito roído de vermes, dizendo:

“Vê, príncipe, como se morre, e como se acabam as grandezas do mundo”.

Depois exclamou:

“Por que não fui eu, em vez de monarca, simples frade leigo de qualquer ordem!”

Mandou depois que lhe pusessem ao pescoço uma cruz de madeira; e tendo disposto todas as coisas para sua morte, disse a seu herdeiro:

“Quis, meu filho, que estivesses presente a este ato, para que visses como, no fim da vida, o mundo trata ainda os próprios reis. Sua morte é igual à dos mais pobres da terra. Aquele que melhor tiver vivido, esse é que achará junto de Deus mais alto favor”.

E este mesmo filho, que foi depois Filipe III, ao morrer com apenas anos de idade, disse:

“Atendei, meus súditos, a que no meu necrológio somente se fale do espetáculo que tendes presente. Dizei que na morte de nada serve o título de rei, a não ser para sentir-se maior tormento de o haver sido… Oxalá, em vez de ser rei, tivesse vivido em um deserto servindo a Deus!… Ir-me-ia agora apresentar com mais confiança entre seu tribunal, e não correria tamanho risco de me condenar!…”

De que valem, porém, tais desejos no transe da morte, senão para maior desespero e pena de quem não amou a Deus durante a vida? Dizia, por isto, Santa Teresa: “Não se deve fazer caso das coisas que acabam com a vida. A verdadeira vida consiste em viver de modo que nada se tenha a recear da morte…” Portanto, se desejamos compreender o que valem os bens da terra, consideremo-los do leito da morte e digamos logo: Aquelas riquezas, estas honras, estes prazeres, se acabarão um dia. É necessário, assim, que procuremos santificar-nos e enriquecer-nos somente dos bens únicos que hão de acompanhar-nos sempre e que constituirão nossa dita por toda a eternidade.

AFETOS E SÚPLICAS

Ah, meu Redentor!… Sofrestes tantos sacrifícios e tantas ignomínias por meu amor, e eu amei tanto os prazeres e as vaidades do mundo, que por sua causa fui levado a calcar aos pés inúmeras vezes a 43 vossa graça. Mas, ainda que vos desprezasse, não deixáveis de me procurar; por isso, ó meu Jesus, não posso temer que me abandonareis agora que vos procuro e amo de todo o coração, e me dói mais de vos ter ofendido que se tivesse sofrido qualquer outro mal. Ó Deus de minha alma, não quero tornar a ofender-vos nem nas coisas mínimas.

Fazei-me conhecer aquilo que vos desagrada e que não o pratique por nada deste mundo. Fazei que saiba o que vos é agradável e o ponha em execução.

Quero amar-vos verdadeiramente; e por vós, Senhor, aceitarei gostosamente todos os sofrimentos e todas as cruzes que me vierem. Dai-me a resignação de que necessito. Queimai, cortai… Castigai-me nesta vida, a fim de que na outra possa amar-vos eternamente.

Maria, minha Mãe, a vós me recomendo; não deixeis de rogar a Jesus por mim.

Preparação para a Morte – Santo Afonso